Senhora - José de Alencar

Livro: Senhora
Autor (a): José de Alencar
Páginas: 162
Editora: FTD



Aurélia Camargo, filha de uma pobre costureira e órfã de pai, apaixonou-se por Fernando Seixas – homem ambicioso - a quem namorou. Este, porém, desfez a relação, movido pela vontade de se casar com uma moça rica, Adelaide Amaral, e pelo dote ao qual teria direito de receber.
Passado algum tempo, Aurélia, já órfã de mãe também, recebe uma grande herança do avô e ascende socialmente.Passa, pois, a ser figura de destaque nos eventos da sociedade da época.
Dividida entre o amor e o orgulho ferido, ela encarrega seu tutor e tio, Lemos, de negociar seu casamento com Fernando por um dote de cem contos de réis. O acordo realizado inclui, como uma de suas cláusulas, o desconhecimento da identidade da noiva por parte do contratado até as vésperas do casamento.
Ao descobrir que sua noiva é Aurélia, Fernando se sente um felizardo, pois, na verdade, nunca deixara de amá-la. E abre seu coração para ela.
A jovem, porém, na noite de núpcias, deixa claro: "comprou-o" para representar o papel de marido que uma mulher na sua posição social deve ter. Dormiram em quartos separados. Aurélia não só não pretende entregar-se a ele, como aproveita as oportunidades que o cotidiano lhe oferece para criticá-lo com ironia. Durante meses, uma relação conjugal marcada pelas ofensas e o sarcasmo se desenvolve entre os dois.

Clássico, é a palavra que define este livro. Publicado em 1874, é um dos últimos romances do autor brasileiro, José de Alencar. Livro que eu dei a sorte de comprar por dois reais e me apaixonar com a leitura.

Vou ser sincera e dizer que a principio a leitura é bem difícil, uma vez que possui  um vocabulário bem arcaico, em uso na época em que foi publicado. Mas quando encontrei o ritmo da escrita de Alencar, a leitura fluiu que foi uma beleza.


O preço
A senhora que dá título ao livro é Aurélia Camargo, uma moça de 19 anos, órfã e muito rica, graças a uma herança vinda de um avô que pouco conheceu. Vive com sua "guarda-moça", D.Firmina. Viúva, que atende a todos os caprichos da moça e a acompanha aos infindáveis encontros da sociedade carioca.

A bonita moça chama atenção de todos, sendo muito cortejada, por sua beleza, destreza e generoso dote. Mas nem sempre foi assim. Com os fashbacks,  que intercala o momento presente, vemos que a menina veio de berço muito pobre e teve o coração partido por não ser dona de nenhum bem.

Por despeito e um amor que ainda arde, Aurélia, com a ajuda do otimista tio e tutor, compra um noivo.  O noivo é Fernando  Seixas, o rapaz que partiu o coração da menina quando pobre. O arranjo é feito sem que Fernando saiba quem é misteriosa noiva, mas tem a garantia de que é bela, não é manca e é muito rica.


A quitação
Fernando não aceita de imediato, uma vez que está de compromisso com Adelaide Amaral, uma rica moça que é apaixonada por outro homem, Dr. Torquato, que infelizmente é pobre. Aurélia sabendo disso oferece ao homem uma boa quantia para conseguir a mão de sua rival e deixar o caminho para Fernando livre.

Tudo sai conforme o planejado e finalmente Fernando conhece a noiva. Com a supervisão de D.Firmina, Fernando, hoje um homem honrado e de caráter começa fazer a corte a noiva, reacendo toda paixão que adormecia em seu peito.

Ah! Deixe-me respirar! Nunca fui amada, nem pensei que o seria com tamanha paixão. Careço de habituar-me aos poucos.

Como é uma estória escrita em meados de mil e oitocentos não temos demostrações de afetos arrebatadoras, de nos fazer suspirar, é tudo demonstrado por meio de palavras, na maioria das vezes são alegorias.


A posse
Enfim casados, Fernando está pronto para ter a esposa nos braços, não fosse pelas humilhantes palavras e imposições de Aurélia, revelando que  daquele momento em diante o matrimonio seria apenas de aparências, devendo ele agir como um exímio esposo, que fora muito bem pago para isso.

 O amor deixou de ser um sentimento e tornou-se uma fineza obrigada entre os cavalheiros e as damas de bom tom. 

Essa parte me deixou com muitas expectativas, a todo momento achava que Aurélia iria sucumbir ao fogo que inflamava seu coração, mas ela era decidida. Achei que Fernando chutaria o balde, mas não. Ele aceita seu destino e tem a esposa como dona e ele um simples objetos, como senhora e ele um escravo.


O resgate
Já cansados da situação, ambos vão afrouxando suas convicções e se aproximando. Mesmo sem querer demonstrar, o casal sofre com  noites insone por ciumes e desejo reprimido. Aurélia está certa que o esposo é o velho ambicioso que a trocou por um dote maior e ele certo de que ela nunca o amou, apenas o teve como um capricho de moça rica.

O ciúme não nasce do amor, e sim do orgulho. O que dói neste sentimento, creia-me, não é a privação do prazer que outrem goza, quando também nós podemos gozá-lo e mais. É unicamente o desgosto de ver o rival possuir um bem que nos pertence ao cobiçarmos, ao qual nos julgamos com direito exclusivo, e em que não admitimos partilha.

Onze meses depois desse infeliz contrato ter sido feito chega a hora de Fernando quitar sua divida com Aurélia, podendo finalmente se libertar da dura servidão a sua senhora.

Isto que o senhor chama escravidão, não passa da violência que o forte exerce sobre o fraco; e neste ponto todos somos mais ou menos escravos, da lei, da opinião, das conveniências, dos prejuízos, uns de sua pobreza, e outros de sua riqueza. Escravos verdadeiros,só conheço um tirano que os faz, é o amor; e este não foi a mim que o cativou.

O romance é dividido em quatro partes,  “O preço”, “A quitação”,  “A posse e o “O resgate”. Onde vemos com clareza como  o casamento era um trato comercial, feito entre os pais ou tutores dos noivos.
Através dos diálogos de Aurélia e Fernando, notamos as sutis critica do autor a esse costume social do Brasil imperial. Assim como notamos a sociedade machista que dominava a época e o materialismo que ludibriava a todos.

Queria que me dissessem os senhores moralistas o que é esta vida senão uma quitanda? Desde que nasce um pobre diabo até que o leva a breca não faz outra coisa senão comprar e vender? Para nascer é preciso dinheiro, e para morrer ainda mais dinheiro. 

O desenrolar dos fatos é lento, mas a trama é muito boa. Não sei se quem leu na época de seu lançamento ficava afoito pelo felizes para sempre como eu fiquei, afinal hoje vários romances é "miojo", casal se vê, se apaixona, dá uns amasso, vence umas barreiras, tem alguns filhos e THE END. Mesmo sem beijos e coisas do tipo o amor dos protagonistas é palpável e fica impossível não torcer por eles.

Quanto aos personagens: As mulheres são descritas como bobas apaixonadas, algumas soam até fúteis, enquanto os homens são os intelectuais. E é exatamente a isso que se deve o destaque da protagonista, que depois de uma desilusão amorosa se torna forte, decidida e astuta. Características bem distintas das mulheres da época, destacadas neste romance.

Daí encaminhou-se ao piano, que é para as senhoras como o charuto  para as homens, um amigo de todas as horas, um companheiro dócil, e um confidente sempre atento.

A forma como tudo é descrito bem lembra um romance de época, uma vez que nos traz, de forma vívida, hábitos, etiquetas e cerimônias de uma época e esse em particular do Brasil. Uma leitura difícil, mas muito gratificante. Então mesmo que não seja para um vestibular, eu recomendo a leitura, pois vale a pena.